Misteriosos monólito de Ingá
Segundo se sabe, a Pedra do Ingá continua sendo a “pedra no sapato” dos estudiosos pela complexidade de suas figuras insculpidas na rocha e pelo seu sofisticado simbolismo. Possui cerca de 23 m de comprimento e na sua parte mais alta mede 3,5 m, exibindo uma face lavrada com cerca de 40 metros quadrados de misteriosos caracteres.
O estranho monólito que compõe a Pedra do Ingá é conhecido praticamente desde a descoberta do Brasil, pois sabe-se que o mesmo foi citado pela primeira vez em 1.618, no livro Diálogos da Grandeza do Brasil, atribuído ao português Ambrósio Fernandes Brandão que, segundo os historiadores, se trata de uma obra excepcionalmente carregada de sentido doutrinário e ufanista. É provável que este monumento tenha seu lugar reservado entre os mais intrigantes enigmas arqueológicos já descobertos em nosso planeta. É sabido que se trata do maior, mais complexo e mais misterioso conjunto rupestre que reporta a um passado desconhecido e carrega consigo uma grande quantidade de caracteres e signos ainda por serem decifrados. Esta colossal pedra cifrada está localizada no Estado da Paraíba, na Serra da Borborema, município de Ingá, às margens do rio de mesmo nome, antigo Bacamarte, a 85 km de João Pessoa e a 35 km de Campina Grande. Na época das chuvas este grande monólito fica parcialmente encoberto pela água e no tempo seco pode ser visto em sua totalidade, além de que o leito do rio fica completamente seco, com apenas algumas poças d’água espalhadas em quase toda a sua extensão.
Como o acesso deste importante monumento arqueológico paraibano é relativamente fácil, afirmamos com tristeza que o mesmo vem sendo destruído através dos tempos por vândalos e exploradores de relíquias arqueológicas, correndo o risco de ser irreversivelmente inutilizado para futuras pesquisas e análises mais acuradas de seu conteúdo lítico. Mesmo assim, a Pedra do Ingá continua sendo um magnífico mistério, constituído de um grande monólito de granito assentado sobre o leito do Rio Ingá, com cerca de 23 m de comprimento e altura aproximada de 3,50 m na sua parte mais alta.
As inscrições da Pedra do Ingá se estendem por todo o seu dorso vertical, numa extensão de aproximadamente 16 metros. São, de fato, de uma estranheza indescritível e somente vendo-as de perto é que podemos perceber a complexidade de seus talhes bem elaborados e deduzir que, quanto mais tentamos retroagir no tempo para atribuir aos caracteres deste acervo arqueológico uma explicação simplista, de que teriam sido produzidos por povos primitivos ou indígenas, por exemplo, mais estes se distanciam de uma realidade palpável e mais seu mistério se densifica.
Pensa-se que suas insculturas foram executadas por meio de algum tipo de instrumento pontiagudo, que teria sido manipulado por homens daquela época, semi-bárbaros, até produzir os baixos relevos que ali se acham incrustados. O que não se pode explicar, entretanto, é que estes signos possuem um acabamento primoroso, como se tivessem sido elaborados por métodos muito avançados e não, simplesmente, por intermédio de pancadas ou ranhuras na pedra com ferramentas comuns. Definitivamente, este magnífico trabalho não poderia ter uma explicação tão destituída de imaginação como a que lhe é dada por alguns pesquisadores e não pode, simplesmente, estar ligado a tradições corriqueiras de povos que, sequer, possuíam alguma forma de escrita.
Por outro lado, não se tem notícia de que haja em outro lugar, no Brasil ou fora dele, um conjunto de inscrições rupestres que possam assemelhar-se ao deste monumento arqueológico da Paraíba, tal é a sua excepcionalidade e sua condição desafiadora, tanto em relação à sua forma e métodos utilizados, quanto à sua complexidade e execução de sua vasta petrografia. Além disto, suas insculturas parecem ter sido rigorosamente planejadas, traçadas e executadas, criando assim uma certa dificuldade junto aos estudiosos que pretendem transformá-las simplesmente em arte primitiva ou atribuir a sua feitura aos antigos trogloditas que teriam vivido naquela região. Pode-se dizer que este formidável mistério paraibano distancia-se, inequivocamente, de tudo aquilo que tem sido regularmente encontrado e pesquisado em outros locais do mundo no âmbito da arqueologia, constituindo-se de algo verdadeiramente ímpar no estudo arqueológico, e, até mesmo, podendo se dizer que de trata de uma incômoda “pedra no sapato dos pesquisadores”.
Desde a chegada dos conquistadores europeus ao Brasil que as itacoatiaras (pedras pintadas em tupi) têm sido encontradas e o questionamento sobre a sua origem teve início. Os antigos indígenas que habitavam estas terras (e mesmo os dos dias de hoje) sempre foram unânimes em afirmar que seus autores não foram os seus antepassados e que aqueles que as “escreveram” pertenceram a um passado bem longínquo, quando ainda havia livre convivência entre os homens e os deuses. Houve ainda quem veiculasse uma lenda a dizer que no interior da pedra se encontrava encerrado um grande tesouro, levando muitos vândalos e gananciosos em busca de riqueza fácil a tentarem quebrá-la, sem êxito, tirando-lhe apenas algumas lascas e danificando-a, irreversivelmente.
Detalhes dos enigmáticos caracteres da Pedra do Ingá.
À sua volta podem ser encontrados signos variados e outros enigmas a serem solucionados. Os estranhos e incompreensíveis caracteres semelhantes a ideogramas que ali podem ser vistos, espalhados por diversos lugares, possuem características, aparentemente, muito diferentes entre si. Alguns destes já se encontram bem desgastados pelo tempo, enquanto que outros podem ainda serem vistos com grande nitidez, como se tivessem sido fundidos na pedra. O leito seco do rio mostra inúmeros orifícios escavados na rocha em todo o seu percurso e se tratam de marcas deixadas pelo movimento da água em redemoinhos. Assemelham-se a bacias médias e pequenas e muito lisas, devido ao movimento contínuo da água. Porém, existem alguns poucos destes orifícios, com um diâmetro de, aproximadamente, 20 centímetros e uma profundidade de uns 40 centímetros, que parecem ter sido feitos com uma grande broca metálica, tal a precisão com que foram escavados. Suas paredes são lisas, com ranhuras, semelhantes aos dos furos que são feitos por equipamento metálico cortante e se diferem muito dos outros que se encontram por ali, mais rasos e deformados. Enquanto que os demais permitem que se possa ver a atuação da água corrente, estes outros não guardam as mesmas características e, a nosso ver, não podem ser assim considerados, como resultado de simples erosões da água sobre a rocha.
Do lado oposto à itacoatiara do Ingá, vamos encontrar um outro mistério. Existe ali uma pedra deformada de cor acinzentada, como se tivesse sido amassada, da mesma forma como o fazemos com o barro, contendo diversos caracteres gravados em seu dorso. Na sua parte superior esquerda, há uma depressão semelhante a um pé, como se alguém tivesse pisado ali, enquanto ela ainda estava mole, deixando uma marca bem profunda. Além disso, ela emite um sonido semelhante ao do sino quando é tocada com uma pedra e este som pode ser ouvido, até mesmo, se batermos nela com o nó dos dedos. Parece oca e emite um som metálico.
Toda esta região está coberta de enigmas desta natureza, além do maior deles que é a própria Pedra do Ingá e sabe-se que nas redondezas e em outros lugares mais distantes existem diversas outras inscrições de caráter estranho, monumentos megalíticos e histórias variadas sobre cada um deles.
Como já dissemos, em todo o leito do rio podem ser encontrados muitos caracteres de cunho desconhecido, que fazem com que o espectador se pergunte qual teria sido a importância de tudo aquilo para seus idealizadores e artífices ou qual teria sido seu significado. Considerar, simplesmente, que os agrupamentos humanos na antiguidade não tinham nada com que se preocupar, senão ficar “desenhando” em pedras e esculpindo em rochedos, é por demais destituído de criatividade e bom senso, considerando-se que, em determinados lugares, como na região do Ingá, por exemplo, tais demonstrações de “vagabundagem” são por demais complexas, carregadas de simbolismos expressivos, chegando, até mesmo, a alcançar uma certa exuberância inexplicável. Assim como pode ser observado nas culturas Marajó e Tapajós, em sua complexa simbologia e arte, um esmerado cuidado artístico e lógico, também aqui no monólito do Ingá vamos constatar o cuidado de seus construtores, que se reflete perante os pesquisadores como um sério problema a ser resolvido. É inegável que o tipo de cultura que teria sido responsável por este enigmático trabalho rupestre se coloca num grau muito superior ao de outros “trabalhos” líticos, regularmente encontrados em outras regiões e para alguns estudiosos seria mais cômodo se registros como estes jamais tivessem existido.
Seria lícito afirmar que tais caracteres tivessem sido produzidos por vias naturais, como erosão, segundo alguns ou através de aranhões na pedra com ferramentas rudimentares?
Sabe-se que os índios cariris que habitavam na Serra da Borborema, próximo do Ingá, não possuíam um nível de cultura compatível com o grau de dificuldade que estas insculturas apresentam e não conheciam esses qualquer rudimento de escrita, apesar de terem uma vida bem mais longeva do que outros povos que ali viviam. Os pajés de sua tribo eram exímios em trabalhos de magia e ritos desconhecidos. Diziam que seu povo se originou de uma tribo de homens sábios que teria vindo de um lago encantado (seriam atlantes?). Quanto à Pedra do Ingá, diziam apenas que seus escritos estavam relacionados ao deus Tupã.
Já foram levantadas várias teorias sobre as enigmáticas inscrições da Pedra do Ingá, como por exemplo, o caso de Léon Clérot, que sugeriu que se tratassem de representações de plantas estilizadas, de figuras humanas, de animais e outros sinais desconhecidos. O arqueólogo Alfredo Coutinho Menezes disse tratar-se de figuras zoomorfas, dentre as quais se destacam pássaros e répteis, figuras fitomorfas como o abacaxi e espigas de milho. Mais recentemente, a itacoatiara do Ingá, foi estudada por Jacques Ramondot, que descobriu numa rocha no leito do rio, um conjunto de inscrições, bem desgastadas pelo tempo e pela água corrente, que entendeu ser o esboço de uma constelação. Esta representação assemelha-se a estrelas e mostra pontos interligados entre si, como num mapa, além de incluir outros signos, como uma espécie de serpentina e um disco, tipo solar, que parecem fazer parte do esquema astronômico.
Existem também algumas teorias estranhas a respeito das insculturas da Pedra do Ingá. Uma primeira afirma que aqueles sinais não passam de sulcos naturais na rocha, produzidos pelo tempo e suas variantes (chuva, vento, calor etc.). Para quem conhece este monumento lítico esta teoria seria classificada de, no mínimo, inapropriada, pois qualquer pessoa (mesmo um visitante comum) pode notar que se trata de um trabalho executado por mãos humanas ou um tipo de tecnologia que desconhecemos.
Uma segunda teoria afirma tratar-se de obras produzidas por indígenas ociosos que habitavam a região, que traçavam aleatoriamente riscos para indicar caminhos e outros sinais sem grandes preocupações de manterem coerência nas suas reproduções. Diante da complexidade das insculturas não podemos também concordar com esta teoria, que se apresenta pouco realista e radicalmente simplista para explicar algo de tamanha notoriedade.
Uma terceira teoria, ainda mais absurda, afirma que os signos da pedra lavrada do Ingá não passam de sulcos produzidos por amolação de facas e ferramentas indígenas, esquecendo-se seu formulador de verificar que certos caracteres se encontram a uma altura superior à de um homem comum. Esta condição obriga-nos a justificar que a precisão das formas insculpidas e a integridade de seus contornos, por si só, já desmoralizam esta tese, ainda que sejam observadas por um leigo em arqueologia.
Uma quarta teoria considera que aqueles signos tenham sido produzidos por visitantes europeus e asiáticos que teriam chegado até as Américas e se incursionado pelo seu interior, antes de Colombo e Cabral.
Há ainda uma quinta teoria, bem mais moderada, que relaciona estes signos a uma civilização bem mais remota e muito mais avançada, que teria vivido em terras brasileiras e se preocupado em deixar gravado em pedra uma mensagem para as futuras gerações.
Paralelamente, também existe aquela teoria de que tais caracteres sejam de origem alienígena, registros pétreos de uma raça extraplanetária que aqui esteve em um passado distante e que teria feito estas gravações em seu dorso, apresentando certos aspectos de seus conhecimentos intergaláticos.
Como referência de uma avaliação séria a respeito deste monumento, podemos citar o pesquisador Luiz Galdino, que preferiu tratá-lo com a reverência que ele merece no cenário arqueológico, assim como aos seus caracteres desconhecidos. Destacamos o seguinte em sua obra Itacoatiaras – uma pré-história da arte no Brasil: “A pedra do Ingá, com seus relevos de acabamento esmerado destaca-se, imediatamente, como um exemplo ímpar, diante do vasto acervo de itacoatiaras espalhado por todo o país. As inscrições são gravadas em baixo-relevo, mediante sulcos largos e profundos. Nos pontos melhor conservados, percebe-se, ainda, vestígios de uma antiga pintura que recobria o fundo dos sulcos”.
E ainda: “Os signos estilizados ao extremo supõem um prolongado período de evolução e aprimoramento. Estranhamente, esse signário mostra-se único. Mais fácil imaginá-lo como a obra de um povo estranho que atravessou a região, não deixando outros testemunhos, do que pensá-lo como a evolução natural a partir dos exemplares mais primitivos existentes no resto do país”.
Conjunto de insculturas modeladas da Pedra do Ingá.
O certo em tudo isto é que a Pedra do Ingá tornou-se presença viva e surpreendente no cenário arqueológico do nordeste brasileiro, como se se tratasse de algo que não pudesse estar ali onde se encontra, com seus caracteres incompreensíveis e desafiadores. Se os compararmos com outros da própria região, estes se fazem tão irreais e absurdos, que não deixam de causar grande incômodo no meio acadêmico, diante da cultura vigente e dos rígidos conceitos de análise, que não podem permitir que nenhum acontecimento no passado da Terra possa se colocar fora dos padrões pré-definidos de verificação e classificação científica.
Acreditamos, seja esta, talvez a causa de nosso estarrecimento diante de “realidades” que, como estas, se apresentam muito mais como ficção do que como possibilidade e muito mais como um desafio inadmissível com a chancela de inexplicável, do que como algo que precisa ser encarado sob uma nova perspectiva de pesquisa e análise, e de uma percepção mais acurada desta realidade.
A Pedra do Ingá é, sem dúvida, um dos mais expressivos registros rupestres do Brasil perdido nas caatingas paraibanas e o maior testemunho silencioso de que em passado longínquo o solo brasileiro teria sido palco de uma cultura avançada que registrou ali parte de seu conhecimento perdido. Desta forma, podemos tomá-la como prova de que já tivemos uma escrita pré-histórica no Brasil, face à expressividade e à coerência de seus signos, aplicados magistralmente lado a lado, apesar de aparentarem, em princípio, uma certa descontinuidade e desordem.
Temos convicção de que ela esconde uma chave para sua compreensão e que a mesma se encontra ali, interagindo com seus demais caracteres. Resta-nos descobri-la. Outro fator que teríamos de acalentar é que sua análise terá de considerar as condições que estabeleceram a lógica de sua feitura, na época em que foi lavrada e artisticamente insculpida, pois estas deveriam ter sido muito diferentes das que temos hoje para estudá-la e compreendê-la, o que expõe um novo empecilho para identificação de sua chave e sua decifração.
Acreditamos que tal condição e grau de dificuldade se devem muito mais ao fato de querermos compreendê-la com o raciocínio atual e o conhecimento que possuímos hoje, sem nos atinarmos em procurar aprofundar no tempo (como no caso das interpretações dos códigos maias e egípcios) para buscar a forma como aqueles povos entendiam a vida na Terra e observavam o céu, os astros, os planetas, as estrelas, as estações do ano, as variações do tempo e as mudanças provocadas por estas variações. Um mesmo signo ou ícone que usamos regularmente hoje, aceito e compreendido por quase toda a população da Terra poderia, em futuro distante, significar um grande enigma para os estudiosos, por estar o mesmo muito distante de seu tempo e por tentarem aqueles analisá-lo sob sua ótica, seus conhecimentos e suas perspectivas.
Estas magníficas insculturas ou moldes na pedra foram feitas em baixo relevo, em sulcos largos e profundos, tipo meia-cana, com o objetivo, talvez, de fazê-los perenizar no tempo, o mais longe possível. Seriam ícones de um tempo perdido no passado da Terra? Ou seriam apenas parte de um conhecimento milenar esquecido pela memória dos povos?
Segundo os pesquisadores podem ainda ser encontrados vestígios de que estes signos estiveram cobertos por tinta para, certamente, fazê-los destacarem-se a grande distância. As formas gravadas na pedra são variadas e algumas de grandes proporções, assemelhando-se muitas delas a figuras zoomorfas e antropomorfas, como já foi dito, algumas geométricas, apresentando, porém, na sua maioria, estruturas de cunho desconhecido. No entanto, todas elas foram elaboradas com alto grau de complexidade e cuidado.
Diante da excentricidade deste painel lítico torna-se difícil não considerarmos que possam vir tratar-se de uma espécie de escrita, pictográfica ou ideográfica, uma vez que seus signos são estranhamente estilizados, o que exigiria um longo estágio de evolução e aprimoramento, além de conhecimentos específicos para serem reproduzidos. Sabe-se que a pictografia representa o estágio mais primitivo da escrita, de forma que cada elemento deste sistema constitui-se no próprio pictograma. Este, por sua vez, não é outra coisa que senão a reprodução de um desenho auto-explicativo e de significado próprio, que está ligado à sua própria forma. Por outro lado, o ideograma amplia este contexto na representação de sua simbologia, de forma que, enquanto na pictografia um círculo significa somente o Sol (por exemplo), no ideograma este poderia simbolizar um atributo do Sol, como a luz e o calor, ampliando o grau de percepção de um signo.
Diante do elevado grau de dificuldade para compreensão dos signos milenares do Ingá, faremos a seguir uma breve exposição de algumas teorias de pesquisadores brasileiros, que se preocuparam em debruçarem-se sobre sua vasta simbologia, numa tentativa de compreendê-la integralmente. Ao final, na 3ª parte, destacaremos o trabalho do grande pesquisador Gabrielli Baraldi e incluiremos a opinião do autor deste estudo e suas observações, após sua visita a este esplêndido monumento arqueológico brasileiro.
AS PESQUISAS DE GILVAN DE BRITO
Em primeiro lugar queremos citar o pesquisador Gilvan de Brito e seu livro “Viagem ao Desconhecido – Os Segredos da Pedra do Ingá”, que tendo o cuidado de incluir em seus estudos outros registros rupestres de relevante importância no estado da Paraíba. Neste seu magnífico trabalho emite a idéia de que no espaço compreendido entre o mar e o Planalto de Borborema, pode ser encontrada uma grande profusão de material lítico, pictográfico, ideográfico, dolmens, muralhas de pedra e outras evidências que indicam a passagem de grupos humanos pela região, povos que tiveram um certo grau cultural que os permitisse gravar em pedra bruta caracteres sofisticados e erigir “construções” com características notadamente megalíticas.
Quando Gilvan diz que “o maior e mais importante sítio arqueológico do Brasil localiza-se, provavelmente, na Paraíba,” haveremos de concordar com ele, pois quando ali estivemos pudemos ter esta mesma impressão e depois de compará-la a muitos outros, reforça-mos ainda mais esta convicção. Assim como outros, também este autor sugere que as inscrições do piso, ao lado do painel vertical do Ingá, possa fazer referência a conjuntos constelatórios, apresentando objetivamente seu pensamento em relação àqueles traçados geométricos com a Constelação de Orion, Peixe Austral e Grus.
Seu estudo, entretanto, se detém mais demoradamente no grande painel vertical, devido à sua profusão de símbolos, pontos capsulares e ideogramas, além da sua notável expressividade, delicadeza dos traçados e dos cortes das insculturas, e sua estranheza. Apesar de os arqueólogos atribuírem a estes signos, quase sempre, classificações mais comuns, como zoomorfas, fitomorfas, cosmogônicas, fálicas e antropomorfas, Gilvan acredita que os mesmos possam ter um significado bem mais contundente. Acena que a Pedra do Ingá poderia ter sido insculpida com apurada técnica e um conhecimento específico de seus autores, pois a linhas inicialmente traçadas foram, posteriormente, gravadas na rocha com fino acabamento e polimento “lembrando perfurações realizadas através de modernos equipa-mentos de raio laser”, conforme comenta.
Há uma variedade de formas gravadas neste painel principal como linhas retas, pontilhadas, espirais, canais paralelos, curvos, circulares e lineares, mas não se podem ver, conforme observa, figuras triangulares nem ornamentais. Segundo pensa, tratam-se de símbolos que tentam materializar uma idéia específica, pois encontrou traços significativos que fundamentam tal pensamento, formas silábicas e ideográficas que procuram “uma função determinada na comunicação escrita”. Neste sentido destacou alguns caracteres (exemplificados no quadro abaixo), para aventar a hipótese de que somente uma forma de inteligência, é que poderia ter criado aquele painel ordenado de mensagens cifradas, certamente, com a finalidade de levar até o futuro as impressões culturais de seu povo. Abaixo apresentamos quadro com exemplos da classificação tipológica comentada por Gilvan de Brito.
Para Gilvan de Brito as insculturas gravadas em Ingá devem ter sido obra de um povo que aqui teria vivido em passado longínquo, onde cada componente desta raça teria oferecido sua contribuição para a feitura deste magnífico conjunto lítico. Para ele, a comunidade impulsionada pela visão do artista que havia idealizado o painel incumbiu-se de rasgar a pedra já marcada pelos contornos riscados por sua mão hábil e deixar para posteridade o primoroso resultado de seu trabalho. Com cuidado analisa os signos em separado, comparando a figura esguia do início do painel (em sua parte mais alta) à uma balança rústica, sugerindo, até mesmo, que a Pedra do Ingá venha a ser um túmulo de um ilustre visitante que teria ensinado aos moradores da região novos conhecimentos.
Gilvan faz uma interessante ligação entre a Pedra do Ingá, as pirâmides de Queops, no Egito, e Theotihuacan, no México, com a possível localização da Atlântida. Traçando uma linha reta entre as duas grandes pirâmides, do Egito e do México, e dividindo o Trópico de Câncer exatamente no meio, entre as duas pirâmides citadas, traça uma linha vertical, tendo abaixo a localização da Pedra do Ingá e acima, próximo à Groelândia, a localização da desaparecida Atlântida (ver ilustração abaixo). Tal interpretação não nos parece inconcebível, porque também acreditamos que existe uma estreita relação entre este lendário continente desaparecido, o antigo Egito e os povos Maias. Por que não incluir a Pedra do Ingá e sua complexa simbologia neste contexto histórico ainda por decifrar, principalmente, se podemos observar esta situação emblemática entre os mesmos?
Gilvan cita outros pesquisadores que alegam que tais inscrições teriam sido feitas por habitantes indígenas da região. Entretanto, discorda dos mesmos, não reconhecendo que as gravações do Ingá tenham, sido produzidas pela ociosidade e o espírito brincalhão e esportivo dos índios brasileiros. Avançando em suas pesquisas e utilizando-se de observações feitas na seqüência de pontos capsulares no alto dos signos insculpidos e nas representações que lembram a lua, elaborou estudos numéricos e analíticos, chegando a conclusões muito interessantes que gostaríamos de destacar.
ITENS ANALISADOS POSIÇÃO OFICIAL POSIÇÃO LEVANTADA
Ano Solar 366 dias (ano bissexto) 366
Ano Lunar 354 dias 342
Velocidade Orbital 3.700 km/h 3.660
Perigeu (menor distância entre a Terra e a Lua) 356.375 km. 366.000
Apogeu (maior distância entre a Terra e a Lua) 406.720 km. 408.000
Raio da Lua 1.700 km. 1.710
Inclinação da Órbita 5,1454º 5,9
Inclinação em relação ao equador terrestre 23,5º 24
Distância Terra-Lua (eixo a eixo) 384.500 km. 380
Medida do PI 3,14 3,18
Diâmetro do equatorial da Lua 3.476 km. 3.473
Área da Lua 38 milhões km2 38
Densidade da Lua 3,34 3,36
Distância média Lua-Sol 149.000.000 km. 148.200
Ciclo de Saros (repetição dos eclipses) 18 anos, 11 dias, 8 horas 18
Gilvan levanta a hipótese de que há vestígios ideográficos nas insculturas do Ingá, considerando-se que a escrita ideográfica é caracterizada pela síntese, o que pode ser notado na emblemática conformação das figuras deste painel milenar e no mistério da técnica utilizada em sua feitura. Para o mesmo, os caracteres deste monumento paraibano não se assemelham totalmente aos hieróglifos e alfabetos de outros povos, porém, argumenta que “os primeiros vestígios identificam-se com as línguas que se constituíram posteriormente na principal fonte de todos os dialetos existentes, o que nos levaria a supor na organização daqueles sinais como a raiz das línguas do passado que deram lugar aos alfabetos hoje conhecidos.” Daí, faz relações com os signos encontrados em Glozel (França), com os hieróglifos hititas, a escrita etíope e muitos outros alfabetos, não deixando de mencionar a estranha simbologia hieroglífica encontrada na Ilha de Páscoa.
As conclusões deste autor, que o mesmo prefere converter em sugestões, são essencialmente coerentes, considerando-se a estranheza sofisticada dos caracteres do Ingá e a dificuldade de identificação destes com outras culturas. Segundo Gilvan “ninguém pode dizer que conhece a solução de um enigma apenas porque tem idéia a respeito do que possa ser o objetivo incomum.” E ainda, “que as explicações perdem força quando se observa que a verdade definitiva não foi atingida e que as teorias apenas procuram confundir os céticos”.
Sugere então, diante das evidências, que o painel da Pedra do Ingá teria sido utilizado pelos antigos povos da região como meio de expressão, objetivando deixar para a posteridade uma mensagem relacionada aos hábitos de seu povo. Alerta, entretanto, que seus autores insculpiram seus elementos como um quebra-cabeças, exigindo inteligência, precisão e disposição no trabalho empreendido para sua decifração. Não poderia ser por isto, obra dos indígenas que habitaram a região, pois sabe-se que tais atributos não faziam parte (e nem o fazem hoje) da cultura desses grupos que eram naturalmente indolentes e avessos a trabalhos desta natureza.
Sugere ainda que o sistema simbólico utilizado poderia estar relacionado a algum ramo da língua indo-européia, por causa da utilização de pictogramas semelhantes aos da Ilha de Páscoa e sua relação com o signos não decifrados do Vale do Indo. Finalmente, sugere que sejam efetuados levantamentos antropológicos mais aprofundados e pesquisas arqueológicas para auxiliar nos estudos de decifração deste enigmático monumento, que poderia tratar-se de um verdadeiro repositório de informações sobre o passado de nossa terra.
A TEORIA DE FRANCISCO C. PESSOA FARIA
Uma outra teoria foi emitida pelo pesquisador Francisco C. Pessoa Faria, médico por profissão, que por um período de trinta anos desenvolveu estudos na Pedra do Ingá. Após análises aprofundadas nos signos insculpidos neste monumento, concluiu que possuem conotação astronômica e que a intenção de seus autores foi, objetivamente, deixar uma espécie de documento perene sobre as observações que haviam feito no firmamento, no sol, na lua, nas estrelas e nas constelações. Segundo o pesquisador esses criteriosos observadores milenares decidiram fazer então o registro de efemérides notáveis de seu tempo, deixando “anotado” em pedra bruta o que conseguiram perceber sobre o movimento dos astros na abóbada celeste.
Francisco Faria escreveu um livro intitulado “Os Astrônomos Pré-históricos do Ingá”, onde desenvolveu suas conclusões a respeito de sua tese astronômica, procurando fazer relações entre as constelações atuais aos agrupamentos de signos artisticamente “moldados” no monólito paraibano.
Segundo sua teoria certas formas insculpidas tratam-se de desenhos estilizados das doze constelações zodiacais, como também podem representar outras constelações. Os pontos capsulares na parte superior da pedra seriam uma representação da eclíptica (a órbita da Terra em torno do Sol), representada pela circunferência imaginária que representa a trajetória do sol na esfera celeste.
Alguns dos signos mais complexos o autor os relaciona com as movimentações dos grupos estelares durante as estações do ano. Assim, a pictografia que assemelha-se a um cocar indígena superpondo vários pontos capsulares justapostos e um signo abaixo destas representações, o autor relaciona a uma espécie de assinalador do equinócio, podendo desta forma, significar a mudança de posição do sol do hemisfério norte para o hemisfério sul. As figuras que se acham abaixo deste conjunto, como a forma antropomorfa, o círculo seccionado em duas partes e a dupla de pontos capsulares próximo destes signos, representa-riam fenômenos espaciais e terrestres relacionados com a efeméride equinocial.
Apesar de sua análise criteriosa o autor afirma que não é possível estabelecer uma cor-relação rigorosa entre as insculturas do Ingá e as constelações conhecidas, por duas razões:
1. Não se pode afirmar que os povos que “trabalharam” os signos destas itacoatiaras possuíam os mesmos conhecimentos que temos hoje sobre as constelações e o movimento do céu nas estações;
2. Não temos como saber se as divisões constelatórias possuíam as mesmas configurações e posições que possuem hoje no caminho do zodíaco.
Neste sentido, como não se conhece a data correta em que estas insculturas poderiam ter sido feitas, teríamos um problema adicional a resolver, pois quanto mais retroagirmos no tempo, mais as probabilidades de termos uma percepção diferente do céu em relação à sua condição atual se tornam mais pronunciadas. É provável que há alguns milhares de anos no passado, tivéssemos uma posição diferente das constelações e até mesmo a forma de observa-las, traçá-las no céu e interpretá-las, poderiam ser muito diferentes da forma como o fazemos hoje.
Francisco Faria atento a estes fenômenos não desconhece as dificuldades de uma interpretação como a que propõe, mas pensa que não poderia se furtar em apresentar certas coincidências que teria observado em algumas constelações conhecidas com certos registros nos petróglifos do Ingá. A nosso ver, seus estudos e suas conclusões não deixam de ser muito relevantes, pois ajudam a levantar discussões em torno deste enigmático monumento arqueológico paraibano, estranho demais para as pretensões de certos estudiosos que prefeririam ter algo mais simples para analisarem, mas que ali permanece silencioso desafiando a argúcia do intelecto contemporâneo.
ESTUDOS DE AURÉLIO M. G. DE ABREU
O insigne pesquisador Aurélio M. G. de Abreu aventou a hipótese de que o monumento do Ingá venha ser parte de “um contexto mais amplo, ligado diretamente a uma cultura de grande envergadura que se teria desenvolvido no atual Paraíba”. Complementa o pesquisador que “nesse estado sobrevivem lendas e citações sobre fatos insólitos, todos ligados à existência de uma civilização nativa que atingiu o estágio da escrita, gravando longos textos não só em pedra como também em livros de casca de árvore, localizados e destruídos pelos religiosos no período colonial”.
Aurélio de Abreu afirma que fora da Paraíba não existem exemplos de inscrições parecidas com as do Ingá que teriam sobrevivido ao tempo e à destruição deliberada. Em suas avaliações sobre as mesmas, pergunta o professor se não teriam os misteriosos habitantes da Ilha de Páscoa passado pelo Brasil, deixando aqui a marca de sua linguagem, ou se teriam saído destas antigas terras brasilis os portadores da cultura que se formaria naquela ilha do pacífico?
OUTROS ESTUDOS
O pesquisador Fernando Moretti afirma que existem 114 signos na Pedra do Ingá, variando desde cerca de 50 cm. de altura por 3 cm. de profundidade, representado frutas, répteis, pássaros e estrelas de tamanhos variados. Aventa a hipótese de que estes sinais possuam semelhanças com os da cerâmica Marajoara e Tapajônica, afirmando que seu estilo indica uma cultura superior a dos índios da região ou uma influência muito diferente à desenvolvida ali. Também Moretti acredita que os caracteres do Ingá sejam muito parecidos com os da tábua Kohan Rongo – Rongo, da Ilha de Pascia.
Também o prof. Alfredo Coutinho de Medeiros Falcão encontrou nos diversos pontos justapostos próximo ao painel principal da Pedra do Ingá uma grande identificação astronômica, como se quisessem mostrar agrupamentos de estrelas. Emitiu a hipótese de que este conjunto no piso horizontal se tratasse da própria representação da constelação de Órion, devido a semelhança dos pontos ali traçados e as estrelas que faz\em parte da mesma.
Muitos pesquisadores não admitem que possa ter havido uma escrita fonética no Brasil pré-histórico, mas certas inscrições rupestres encontradas de norte a sul do país sugerem caracteres ligados a uma linguagem primitiva situada em alguma parte do território brasileiro. Se analisarmos detidamente a língua tupi-guarani vamos notar que ela é riquíssima em termos linguísticos, mesmo que dela não conheçamos ainda a estrutura de um alfabeto, claramente estabelecido, para sustentar seu linguajar nativo e seus derivados.
A Pedra do Ingá levanta a suspeita de que tenha havido uma língua primitiva no Brasil. Ao estudarmos com critério seus caracteres milenares, alvo deste estudo, não podemos deixar de nos surpreender com suas primorosas reproduções e notável polimento, e não refletir sobre a existência de um linguajar ideográfico, perdido nas cinzas de nosso passado. Suas diversas representações estilizadas, algumas desconhecidas, outras se mostrando como formas zoomorfas, antropomorfas, fitomorfas, cosmogônicas ou caracteres com definições espaciais bem planejadas, conduzem-nos a pensar que possam tratar-se, efetiva-mente, de uma espécie de escrita racional, idealizada e produzida para transmitir conhecimento, apesar de não compreendermos ainda o seu código secreto.
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