quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Mestre Romeu Bertho 7º Grau - JIU JITSU



Dissecando a vida de Romeu Bertho, o discípulo de George Gracie (entrevista especial)Por Fábio Quio Takao, pesquisador e colaborador do blog:

Desde 1959 está em atividade a primeira academia de Jiu Jitsu do interior de São Paulo, a academia de Romeu Bertho. Nascido em 1937 praticante de Arte Suave desde os 18 anos, Mestre Romeu Bertho é um típico representante da velha guarda do Jiu Jitsu. Extremamente amável e educado, físico enxuto e leve, iniciou-se nas artes marciais através do Judô que mais tarde trocou pelo Jiu Jitsu.
Romeu foi provavelmente um dos mais fiéis alunos de George Gracie, demonstrando isso através de fotos do mestre espalhadas pela academia. O experiente mestre orgulha-se de ter feito grandes competidores e professores ao longo da carreira, mantendo ainda hoje seus alunos em diversos campeonatos.
Testemunha viva da época onde o “desafio Gracie“ era a tônica de expansão do Jiu Jitsu, tendo ele mesmo feito várias lutas de Vale-Tudo para provar a superioridade da arte criada pela família Gracie, Romeu nos concede essa reveladora entrevista:

ROMEU BERTHO (arquivo pessoal)
ROMEU BERTHO (arquivo pessoal)
Quando se deu seu primeiro contato com o Jiu Jitsu?
ROMEU BERTHO: Em 1957 o George Gracie estava em Jaú-SP e soltou folhetos falando sobre o Jiu Jitsu em toda a região do interior de São Paulo, inclusive em São Carlos-SP, que é a cidade onde eu moro até hoje.
Eu tinha meus 19 anos e já treinava Judô desde os 12 anos no Kaikan, que era uma associação de japoneses da cidade. Nessa época eu andava com a “japonesada” e só conhecia o Jiu Jitsu através de reportagens da antiga revista “O Cruzeiro“.
Ao ver esses folhetos do George, imediatamente fiquei curioso. Por ironia do destino, o George Gracie veio morar um quarteirão acima da minha casa. Ele havia se mudado há poucos dias com o George Filho, uma filha e a Sra. Lina, sua esposa. Entrei e me deparei com um senhor fora de forma, já meio calvo e usando óculos. (risos). Natural para um homem com 46 anos, mas nada que aparentasse ser um grande lutador.
Perguntei sobre as aulas e voltei após um mês para me matricular e comecei a treinar.

Romeu Bertho demonstrando técnica de defesa pessoal
Romeu Bertho demonstrando técnica de defesa pessoal
Como eram os treinos?
ROMEU BERTHO Ele baseava seus treinos em defesa pessoal. Inclusive as aulas eram individuais e raramente eram em dupla. Percebi logo no início que ele não aprovava que eu ainda mantivesse os treinos de Judô. Parei de freqüentar os treinos de Judô, e após alguns meses tive uma grande surpresa. Ao chegar para pagar a mensalidade, o George me fala: “hoje será sua última mensalidade. “ Fiquei muito surpreso, pois estava pois estava gostando muito dos treinos de Jiu Jitsu. Perguntei a ele se ele não ia mais me ensinar o Jiu Jitsu e resumiu: “ Pelo contrário Romeu, AGORA é que vou começar a te ensinar de verdade, pois você passa a ser meu amigo. “
A partir disso, eu passei a treinar diariamente e inclusive a ser seu auxiliar nas aulas dos outros alunos. Além disso, o George adorava me testar com os alunos mais fortes.

Como era a graduação na época?
ROMEU BERTHO: Não havia sistema de cores de faixa como a atual. Todos usavam faixa branca e os mestres usavam uma faixa azul escura para diferenciar. Em várias fotos que tenho do Hélio Gracie, ele está de faixa azul e até mesmo de faixa branca. O Jiu Jitsu dessa época era voltado para defesa pessoal e principalmente aos desafios. A conotação esportiva veio muito mais tarde e foi a federação que organizou as graduações como são conhecidas hoje.

Romeu Bertho (esquerda) e George Gracie - 1959
Romeu Bertho (esquerda) e George Gracie - 1959
Quando foi que o George Gracie autorizou você a ensinar o Jiu Jitsu?
ROMEU BERTHO: Por volta de 1958, o George vai morar em Araraquara, que é 40Km de São Carlos e passa então a dar aulas simultaneamente nas duas cidades. Em 1959 ele vai para Catanduva e me chama para ter uma conversa. “Ele me disse: “Romeu, você agora será o responsável pelas aulas em São Carlos, mas ainda manteremos contato constante”. A partir desse ano, eu passei então a ser professor e responsável pela 1ª academia de Jiu Jitsu Gracie do interior de São Paulo.

Como foram seus primeiros desafios de vale-tudo?

ROMEU BERTHO A principal forma dos Gracie provarem a superioridade técnica do Jiu Jitsu era desafiar praticantes de outras artes marciais e os valentões da cidade, o que veio a se tornar uma marca registrada da família. George Gracie não fugia à regra. Devido a sua idade, não fazia desafios há muito tempo, mas agora como eu era seu novo discípulo, a tradição era retomada. Assim que chegou a Catanduva em 1963, George lança o desafio e somente depois de conseguir um adversário, me comunica a notícia: “Romeu, arrumei uma luta para você“. Apesar da minha surpresa, ele afirma: “Não se preocupe“.
Assim que cheguei a Catanduva é que tive noção do tamanho do desafio. Havia faixas na cidade toda e cartazes anunciado três lutas preliminares e a minha como principal. O evento aconteceu numa quadra e teve lotação esgotada. A luta seria sem kimono.


Como foi essa luta?

ROMEU BERTHO :A expectativa era a mesma de sempre. Como um lutador de 65Kg poderia vencer o Constantino, um estivador que carregava 400 sacos de café por dia e pesava 97kg? Apesar dessa diferença a luta foi muito rápida. Levei a luta para o chão e apliquei um estrangulamento fazendo-o ficar roxo e bater.

Houve mais desafios?
ROMEU BERTHO: Sim. O George que já tinha como objetivo viajar para divulgar a arte e tinha como principal cartão de visita os desafios onde eu lutava.  Fiz lutas também em Votuporanga e Barretos com adversários que não me recordo os nomes, mas o desfecho das lutas era sempre o mesmo: finalização rápida.
Houve uma luta em Novo Horizonte, onde ganhei um homem muito forte que era padeiro e praticava luta livre. Há poucos anos atrás, num campeonato paulista de Jiu Jitsu, um senhor me agarra por trás e em tom cordial me fala: “Se fosse hoje Romeu, a luta seria diferente!“. Fiquei muito feliz por ele ter me reconhecido e demos muitas risadas. Ele se tornou aluno do George e montou uma academia também.

Mesmo morando em cidades diferentes o Sr. continuou sendo aluno do George?
ROMEU BERTHO: Durante todas as viagens do George pelo interior de São Paulo, mantínhamos contato para que eu enfrentasse os desafios. Ele fazia questão de manter o que hoje chamamos de reciclagem. Ao chegar nas cidades onde ele estava, antes dos desafios ele dizia: “Romeu, vou te dar uma aula“.

Quando foi a última vez que o viu?
ROMEU BERTHO: Por volta de 1967 o George estava em Barretos e me chamou para uma conversa. Chegando lá ele me fala que estava voltando para o Rio de Janeiro e queria que eu fosse com ele para poder me aperfeiçoar ainda mais. Meu pai havia morrido e eu cuidava de minha mãe, então não pude ir. Isso nos emocionou muito. A partir disso, perdi o contato com ele.

Após a partida de George, como foi o desenvolvimento de sua academia?
ROMEU BERTHO: Após a ida de George Gracie para o Rio de Janeiro, não havia no interior de São Paulo competições ou outras academias de Jiu Jitsu. Como eu buscava sempre a evolução, passei a competir e pôr meus alunos para competir também nos torneios de Judô. Essa influência do Judô foi muito útil, pois além da parte de quedas, eu sempre adotei as exigências de disciplina e desportividade do Judô, que eram pouco exigidas no Jiu Jitsu, até porque os próprios Gracie não adotavam isso. Quando começaram os primeiros torneios de Jiu Jitsu, sempre consegui bons resultados com os alunos, tendo como destaques meus dois sobrinhos Fernando Zopellari e Lírio Carlos de Campos, ambos com diversos títulos e atualmente também com academias próprias.
Apesar dos desafios serem característica da família Gracie, eu sempre me preocupei com o caráter dos meus alunos, não permitindo jamais que eles se envolvessem em brigas fora da academia, chegando mesmo a expulsar alguns alunos após saber que os mesmos haviam usado o Jiu Jitsu contra pessoas mais fracas de forma covarde.

E sobre a luta de George Gracie contra Pedro Hemetério?
ROMEU BERTHO: O George passou também pelo nordeste antes de viajar pelo estado de São Paulo. Nessa época, Pedro Hemetério já tinha uma academia na cidade e ficou sabendo que George estava desafiando a todos na cidade. Ao saber dos desafios, Pedro embaraçado pela situação, entra em contato com Hélio Gracie e conta sobre os desafios. Hélio Gracie autoriza Pedro Hemetério a aceitar o desafio. O confronto ocorreu em dezembro de 1952. Os dois mestres se enfrentaram de Kimono e Pedro venceu aplicando um estrangulamento aos 26 minutos. 

Romeu Bertho demonstrando técnica de defesa pessoal
Romeu Bertho demonstrando técnica de defesa pessoal
O George teve um desentendimento com o Hélio. O que ele comentava sobre os irmãos?
O George nunca me falou mal dos irmãos, pelo contrário, só mencionava algo quando era para elogiar. George entre os irmãos foi o que mais viajou pelo Brasil. Mas mesmo de longe, sempre acompanhou os desafios feitos pela família que ficara no Rio de Janeiro. Quando o Carlson empatou com o Ivan Gomes em 1963, o George comentou comigo que achava estranho o Carlson não ter ganhado a luta, pois isso só seria possível se o Ivan soubesse algo de Jiu Jitsu. Isso veio a se confirmar mais tarde, pois Ivan Gomes havia tido aulas com um aluno do próprio George Gracie.

O Sr. conheceu os outros irmãos Gracie?
ROMEU BERTHO: Há uns 10 anos atrás houve uma confraternização organizada em Jaú, e o Hélio Gracie veio junto com o Rorion. Como eu também havia sido convidado, só então tive a oportunidade de conhecê-lo.

Fabio Quio Takao – pesquisador ds história do Vale Tudo / MMA

Publicado também no site parceiro do blog: www.brasilcombate.com.br


OBS.: Nós da OGRO COMBATE recomendamos o BLOG: http://manoamano.blog.terra.com.br/tag/romeu-bertho/


Um comentário:

  1. Imaginem a gama de conhecimentos que esse Mestre deve possuir...É algo fantástico, parabéns ao dono do Blog (http://manoamano.blog.terra.com.br/tag/romeu-bertho/) que publicou a matéria que agora a OGRO COMBATE transcreve!

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